30/08/2024 às 19h27min - Atualizada em 30/08/2024 às 19h27min

Indicado para comunidades vulneráveis, sensor de baixo custo atesta qualidade da água

Com luzes de LED, sensor é altamente sensível para indicar microrganismos mortais presentes na água usada no abastecimento de comunidades

Assessoria de Comunicação EESC - USP / Adaptado do Jornal da USP por Júlio Bernardes
Portal USP São Carlos
Divulgação / EESC
Países em desenvolvimento, Nepal e Brasil fizeram de um de seus graves problemas sanitários que enfrentam, no caso, a falta de tratamento de água adequado em áreas mais pobres, como em comunidades vulneráveis, a motivação para unir conhecimentos e a ciência em busca de soluções.
 
Com esforços de pesquisadores da Escola de Engenharia de São Carlos (EESC), da Universidade de São Paulo (USP), e do Instituto de Pesquisa de Phutung, no Nepal, foi possível a criação de um sistema de detecção de fluorescência que, sem lentes, por meio de luzes de LED, pode fornecer identificação altamente sensível de microrganismos mortais presentes na água. O projeto, que também conta com a colaboração de pesquisadores da Universidade de York, no Reino Unido, foi publicado recentemente no periódico científico Optica.
 
“Nosso ponto de partida foi, justamente, a necessidade de se criar soluções viáveis, ou seja, mais rápidas, baratas e portáteis, para o monitoramento da qualidade da água onde as comunidades vulneráveis vivem. Um dos grandes problemas é que os métodos tradicionais, lentos e caros, raramente podem ser feitos nesses locais, o que resulta na ingestão de água imprópria e suas consequências, com doenças e mortes, muitas delas de crianças, todos os anos”, explica Emiliano Martins, professor do Departamento de Engenharia Elétrica e de Computação (SEL) da EESC e um dos participantes do projeto.
 
“O foco crucial da pesquisa, então, foi criar tecnologias que permitissem esse monitoramento constante da água, elemento básico para consumo humano, mitigando riscos dessas doenças”, completa ele.
 
O trabalho contemplou o desenvolvimento de um novo fluorômetro de monitoramento de água e que, mesmo sem usar qualquer tipo de lente, o que o torna mais leve, menor e mais barato, é capaz de detectar proteínas fluorescentes de bactérias na água até níveis de menos de uma parte por bilhão, o que atende aos critérios da Organização Mundial da Saúde (OMS) para avaliação de contaminação fecal em água potável, com desempenho bastante satisfatório. Para substituir a lente, o instrumento desenvolvido pelos pesquisadores usa uma fonte de luz de LED que excita as moléculas-alvo das bactérias na amostra de água.
 
“As moléculas absorvem a energia da luz, perdem parte dela como calor e emitem o resto da energia por meio de luz de menor energia. A absorção e a emissão dependem da configuração eletrônica das moléculas-alvo”, descreve Martins, que complementa: “A quantidade de luz emitida é medida usando um detector para quantificá-las, o que nos permite inferir a presença da bactéria na amostra”.
 
Lentes x Desempenho
 
Durante o processo de desenvolvimento do instrumento, os pesquisadores observaram os fundamentos da geração de sinais ópticos em aplicações, como o monitoramento da qualidade da água, e descobriram que, embora seja comum a utilização de lentes ópticas em dispositivos como câmeras, microscópios e telescópios, esses componentes ópticos geralmente reduzem o desempenho para situações práticas que não exigem imagens.
 
“Nossa análise revelou que usar uma fonte de luz, detectores e tamanhos de amostra que são todos tão grandes e tão próximos uns dos outros, quanto possível, produz um sinal mais forte, levando a um melhor desempenho para o monitoramento da qualidade da água”, explica o líder da equipe de pesquisa, Ashim Dhakal, do Phutung Research Institute, no Nepal.
 
O sistema criado pelo grupo de pesquisa usa LED’s com luz UV para excitar proteínas de micróbios nocivos e, então, detectar a fluorescência resultante, tendo como alvo proteínas derivadas do aminoácido chamado triptofano.
 
“Entre os aminoácidos essenciais que os humanos e a maioria dos animais que abrigam coliformes em seus intestinos não conseguem sintetizar, o triptofano é o mais fluorescente e pode ser encontrado dentro e fora das células das bactérias e, por essa razão, é o alvo do nosso sistema de detecção na água”, detalha Dhakal.
 
Especializado em desenvolver tecnologias fotônicas de baixo custo que sejam alternativas para as convencionais, o grupo da EESC auxiliou no aprimoramento do sistema com LEDs baratos e de grande área (> 1 mm 2) no UV profundo (< 280 nm), “e que se encaixaram perfeitamente com as necessidades do sensor”, destaca Martins. O sinal de fluorescência alcançado é quase o dobro da força de um sistema com lentes.
 
Próximos passos
 
Os pesquisadores estão animados com os avanços alcançados até o momento. “Nosso sistema já é altamente útil porque a medição sensível e precisa da concentração de proteínas bacterianas que ele fornece está diretamente relacionada à eficiência do tratamento de água, à dose de desinfetantes necessária para a desinfecção e à probabilidade de proliferação bacteriana em um evento de recontaminação”, diz Dhakal.
 
Outra vantagem ressaltada pelos pesquisadores são as fáceis interpretações dos resultados de medição, realizada por meio de números simples e indicadores de semáforo por pessoas comuns e disponíveis em segundos. “Ele é fácil de usar, o que permite que as partes interessadas tomem medidas necessárias de acordo com os resultados aferidos pelo sistema”, revela Martins.
 
Vale lembrar que os métodos atuais usados para avaliar a contaminação microbiana na água exigem a cultura de amostras de água e, em seguida, a quantificação de bactérias nocivas, o que pode levar mais de 18 horas, tornando-o impraticável quando a confirmação imediata da segurança da água é necessária. Nos países em desenvolvimento, recursos humanos qualificados, infraestrutura e reagentes necessários não estão prontamente disponíveis, o que diminui a eficácia desses métodos utilizados.
 
Apesar dos resultados animadores, o grupo ainda tem alguns desafios a serem superados. “Em algumas situações, nosso sensor ainda dá uma espécie de falso positivo, ou seja, acusa a presença de microrganismos, mesmo com a água tendo sido tratada e estando apta para consumo”, calcula Martins. Ainda segundo ele, “eliminar esses falsos positivos é o principal desafio que estamos abordando neste momento, o que conseguiremos brevemente”.
 
“Estamos evoluindo bem num projeto de alto impacto social e que, vale dizer, utilizou muito pouco recurso financeiro. Acho que é um ótimo exemplo de que é possível fazer pesquisa de ponta mesmo com poucos recursos”, informa o professor da EESC.
 
“Seguimos avançando, esperançosos de que esse trabalho facilite o monitoramento da água em locais de vulnerabilidade, de modo a contribuir para uma redução de doenças e mortes decorrentes do consumo de água inapropriada”, conclui Martins.
 

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